quinta-feira, 4 de abril de 2019

FRANCISCO SANTOS ENTRE A LITERATURA E A MEMÓRIA

          
          O nosso blog foi construído e mantido durante todos esses anos através de colaborações, onde pudemos contar com colaboradores mais modestos, como o mantenedor do blog, mas também com os mais qualificados escritores do Piaui, casos de Francisco Miguel de Moura e João Bosco da Silva. E de muitos outros que tanto valorizaram este espaço, como Zé Joel, Zé Carmo Filho, Irvaldo Lima e uma infinidade de comentaristas que muito nos estimulavam a continuar com o blog.
          Como este espaço foi fruto de muito luta, sempre tivemos o desejo de mante-lo em atividade, apesar da falta de incentivo, seja através das muitas novidades que aparece dia após dia na internet, que faz com que os internautas procurem cada vez mais essas novidades, e deixem de lado os já obsoletos blogs e portais. Ou mesmo pela falta de colaborações.
          Mas, como colocamos acima o nosso desejo de manter acesa a chama do blog, resolvemos postar um texto relacionado com Francisco Santos e a história de seu povo. Esperamos que tenham a paciência, pois o texto é longo mas muito interessante.
          Antes, se faz necessário fazermos uma apresentação do autor deste artigo. Uma monografia apresentada ao final do seu curso de Licenciatura em História, pela Universidade Federal do Piaui, Campus de Picos. Cleovan Sousa, historiador, escritor/poeta, conselheiro tutelar, ativo participante da vida social, cultural e religiosa de Francisco Santos.    
          Vamos iniciar a postagem através de tópicos, sendo o primeiro:


1 INTRODUÇÃO

O trabalho em questão intitulado Francisco Santos entre a literatura e a memória: práticas cotidianas na “terra dos espritados” nas décadas de 1960 e 1970, tem por objetivo fazer uma análise dos aspectos cotidianos dessa pequena urbe piauiense, destacando aspectos religiosos, culturais e sociais, no referido período.
Desde que começamos nossa licenciatura em história o grande dilema que nos permeia é qual objeto de estudo escolher para a realização do nosso trabalho de conclusão de curso. Até o terceiro período não tínhamos nem um norte sobre qual objeto de estudo se debruçar, foi justamente nesse período, ao pagar a disciplina de “Cidades e História”, ministrada pelo professor Dr. Raimundo Nonato Lima dos Santos[1], que surgiu o interesse pela discussão de cidades, a partir de então decidimos trabalhar com essa temática.
O recorte espacial escolhido – a cidade de Francisco Santos – se deu pelo desejo de analisar e compreender como e quais eram as práticas cotidianas na cidade nas primeiras décadas após sua elevação oficial à categoria de município, haja vista que sua instalação se deu oficialmente no dia 24 de dezembro de 1960.



[1] Doutor em História – UFPE. Membro do Grupo de Pesquisa do CNPq "Cidade, Tempo e Espaço". Assessor de Ações de Extensão e Cultura - UFPI/CSHNB. Coordenador de Área de História do Pibid - UFPI/CSHNB. Coordenador do Projeto de Extensão TEMPUS (Teatro Experimental Universitário em Estudos Históricos).  


Além do mais, em algumas conversas informais com moradores mais antigos da cidade, costumeiramente se ouve relatos de que, “antigamente na cidade havia muitas manifestações culturais que hoje já foram extintas”, “antigamente a cidade de Francisco Santos era assim”, “antigamente o povo fazia isso”. Como era a cidade de Francisco Santos no passado? Quais práticas cotidianas e manifestações culturais eram essas? Para respondermos a esses questionamentos e construir uma imagem da cidade, analisaremos os relatos orais dos moradores de Francisco Santos e da literatura local, principalmente as obras de João Bosco da Silva[1] que se referem justamente as décadas de 1960 e 1970, descrevendo suas práticas cotidianas no período em estudo.
Foi a partir desta curiosidade não apenas como historiadores/pesquisadores, mas também como habitantes desta cidade e desconhecedores do seu passado, que nos lançamos em pesquisar a cidade de Francisco Santos nas referidas décadas. Para tanto discutiremos nesta pesquisa práticas cotidianas como educação, religião e comércio. Propomos também uma representação do passado, onde destacaremos as manifestações culturais que existiam nas décadas de 1960 e 1970.



[1] Poeta e escritor franciscossantense autor de vários contos, crônicas e cordéis.

     Escolhida a temática para estudo, outra questão pertinente foi: onde conseguiríamos fontes para construção desta pesquisa?  E foi lendo as obras de João Bosco da Silva, autor de contos, ensaios, cordéis, poesias e outros gêneros, que nos sentimos instigados a ir mais além da leitura, decidimos usar suas obras literárias para analisarmos como a cidade era apresentada nos escritos literários, bem como as produções de outros poetas e escritores locais. Percebemos que ele descreve várias práticas cotidianas da cidade de Francisco Santos dentro do recorte temporal de 1960 a 1970 condizente com nosso estudo, e isso nos instigou a buscar mais detalhes sobre a cidade nessas décadas.
Ao longo da nossa graduação percebemos que a literatura se constitui como uma fonte histórica, possível de se construir pesquisas a partir de sua análise. Sendo assim, é preciso destacar que a cidade de Francisco Santos é riquíssima quanto a sua literatura popular com diversas pessoas que se dedicam ao cordel, ao verso, a poesia. Este trabalho nos possibilitou enxergar a relação de intimidade existente entre a literatura e a história. As obras literárias nos permitem, por exemplo, analisar e compreender uma sociedade, pois é fato que a literatura possui duas dimensões: histórica e social. A característica da literatura de possibilitar a compreensão de uma sociedade ou de um grupo específico, já vem desde as sociedades primitivas como assegura Antônio Cândido:
A poesia das sociedades primitivas permite avaliar a importância da experiência quotidiana como fonte de inspiração, sobretudo com referência às atividades e objetos fortemente impregnados de valor pelo grupo. A medida que fala deles, o poeta assegura a sua posição de intérprete, num sentido que a nós poderia frequentemente parecer anestético. (CÂNDIDO, 2006, p. 40).

Dentro dessa perspectiva nossa pesquisa se pauta na análise de produções literárias: contos, crônicas, poesias e cordéis que trazem em sua essência a cidade de Francisco Santos, sua gente, seu povo e aspectos relacionados à cultura, religião, educação e comércio. Outra fonte utilizada foram os relatos e depoimentos orais dos habitantes da cidade, a partir das informações recolhidas das fontes orais por meio de entrevistas, questionários e conversas informais. Após a coleta das informações, fizemos uma análise comparativa com a literatura, buscando perceber quais são os pontos divergentes entre a memória do povo e a visão dos literatos.
Para compreender a cidade a partir da memória de seus moradores, torna-se de suma importância o uso das fontes orais, dessa forma a história oral foi imprescindível para a realização deste trabalho. Sobre a história oral argumenta Sônia Freitas:

[...] é um método de pesquisa que utiliza a técnica da entrevista e outros procedimentos articulados entre si, no registro de narrativas da experiência humana. Definida por Allan Nevis como “moderna história oral” devido ao uso de recursos eletrônicos, a história oral é técnica e fonte, por meio das quais se produz conhecimento. (FREITAS, 2002, p. 19).

 Tendo em vista que através de conversas informais e também com a realização de entrevistas, onde os sujeitos entrevistados podem narrar suas experiências e lembranças de Francisco Santos das décadas de 1960 e 1970 pudemos (re) construir todo um passado que os moradores da cidade guardam na sua memória. Le Goff (2003) entende a memória como a capacidade de conservar certas informações, “graças às quais o homem pode atualizar impressões ou informações passadas, ou que ele representa como passadas” (LE GOFF, 2003, p. 423).
Sobre as pessoas entrevistadas, as quais nos ajudaram, através de suas memórias e relatos a construir esse trabalho, foram seis, sendo dois homens e quatro mulheres. São eles: João Bosco da Silva, 72 anos, aposentado, poeta e escritor, hoje reside na capital Teresina, e dedica-se em escrever poesias, contos e crônicas; Rosa Isaura Santos, 63 anos, aposentada e poetisa, atualmente dedica-se em prestar serviço na igreja, onde é membro ativa; Maria Carleusa dos Santos Batista de Carvalho, 65 anos, aposentada, atualmente reside em Picos; Rosa de Lima Carvalho, 61 anos, aposentada, exerce funções na igreja e é membro do Apostolado da Oração; Lenite Maria da Rocha Sales, 72 anos, aposentada, também se dedica a servir na igreja; Antônio Borges de Moura, 95 anos, aposentado, ultimamente pela idade não se dedica a nenhuma atividade.
Sobre a fundamentação teórica deste trabalho, nossa discussão foi embasada pelos estudos de Roberto Lobato Corrêa (2000), o qual faz reflexão sobre o que é, e como se constituí o espaço urbano. Este, para o autor, é algo articulado e fragmentado, onde há diferentes núcleos e diferentes processos sociais, definindo o espaço como “um produto social, resultado de ações acumuladas através do tempo, e engrenadas por agentes que produzem e consomem espaço” (CORRÊA, 2000, p. 11); Raquel Rolnik (1995) trazendo a ideia de cidade como ímã, um campo magnético que atraí, reúne e concentra homens. Para Rolnik “a cidade é antes de mais nada um ímã, antes mesmo de se tornar local permanente de trabalho e moradia” (ROLNIK, 1995, p. 13); Michel de Certeau (2008), nos fazendo pensar em  “A invenção do cotidiano” a cidade como escrita e seus moradores como escritores; Sônia Freitas (2002), nos propõe uma reflexão aprofundada no que diz respeito à relação entre história oral e memória; Ecléa Bosi (2003), nos permitindo explorar o campo de experiência pessoal com os eventos cotidianos, registrados na lembrança. Bosi (2003) que nos propõe que há uma história construída ao longo da vida, a partir das experiências do dia-a-dia; Michael Pollak (1989), o qual faz reflexões acerca da memória, apontando esta como sendo uma constituição de acontecimentos, pessoas, personagens e lugares. Pollak (1989) destaca que os acontecimentos podem ter sido vividos pessoalmente, ou vivido pelo grupo ou pela coletividade a qual a pessoa se sente pertencer.
Este trabalho foi dividido em dois capítulos. No primeiro capítulo intitulado “Um olhar sobre Francisco Santos: pensando a cidade de Francisco Santos e suas práticas cotidianas a partir da literatura e da memória” foi feito uma abordagem sobre as práticas cotidianas dos citadinos nesse período. No segundo capítulo intitulado “A cultura de um povo: manifestações culturais na cidade de Francisco Santos nas décadas de 1960 e 1970” dedicamo-nos em abordar as formas de manifestações culturais existentes nessas décadas.


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