terça-feira, 30 de abril de 2013

Protetores do crime

          
                                                  JÂNIO DE FREITAS  - Jornalista(Folha de São Paulo)


          A necessidade e a urgência de bloqueio ao uso de menores por bandidos e monstros como os incendiários da dentista indefesa Cinthya de Souza, em São Paulo, não podem continuar pendentes da discussão tergiversante sobre a menoridade penal. A menos que se continue admitindo, com estupor mas passivamente, que crimes se propaguem amparados na pena máxima de três anos de 'reeducação' para o falso principal autor.

          O truque adotado pela bandidagem é inteligente. Suas ações passaram a ter, como norma, a presença de um menor de 18 anos. No caso de mau resultado final do crime, a gravidade maior do ato é atribuída ao 'dimenor' e, como passaporte para o primeiro nível da bandidagem, por ele assumida. Não considerado criminoso e preso, como de fato é, mas como 'apreendido' para reeducação nos tais três anos máximos, proporciona aos criminosos 'dimaior' penas muito mais leves, como coadjuvantes. E saídas da prisão muito mais cedo, com os benefícios presenteados pela lei.

          Sobretudo em São Paulo, onde a incidência do truque é geral nos crimes em grupo, as polícias ou caíram no golpe inteligente e não se levantaram, ou o aceitaram como um modo de dar os crimes mais depressa como resolvidos. Assim os inquéritos chegam ao juízes, sem muito o que fazer para sanar a deformação. E ganham os bandidos: arriscam o crime, que na maioria dá certo --salvo se há contribuição de denúncia ou acaso-- e, quando não dá, a pena não é intolerável para ninguém.

          A impressão deixada pela rapidez com que uma delegada aceitou a versão dos monstros na morte da dentista vale como ilustração completa do que se passa hoje com o envolvimento dos criminosos de 16 e 17 anos. Palavras dela, para a TV: 'Ele [o 'adolescente'] jogou álcool nela e ficou [brincando, passando?] o fogo, aí o fogo pegou na manga dela e...'. E pronto, logo o crime era dado pela polícia como 'resolvido': o incendiário foi o 'dimenor'.


          Mas por que todos compraram álcool e voltaram ao consultório, senão para incendiar a dentista indefesa? E ainda há depoimentos de outras vítimas, que tiveram os cabelos incendiados como início do mesmo propósito pelos mesmos monstros. Incendiários, pois, todos eles.

          Durante as férias recentes, gastei algumas horas de vários dias para saber como são os programas policiais e como atuam Datena e seus concorrentes, tantas vezes citados, inclusive pelo admirável sociólogo Zé Simão. Sempre o mesmo. Assaltos em grupo, latrocínios em grupo, se apanhados não há dúvida: lá está o cara de 18 anos para ser o dono da arma, o autor do disparo e das piores violências. A quantidade de vezes em que isso se dá dia a dia é assombrosa.

          À parte a idade penal, as autoridades ditas responsáveis, nos governos e no Congresso, e mesmo nas polícias, precisam remediar o problema já. Ou ser pressionadas a fazê-lo. Agravante de corrupção de menor, agravar pesadamente a prática de crime de adulto acompanhado de menor, levando a pena a ultrapassar a vantagem do truque, são exemplos de providências adotáveis com rapidez. Mesmo que o marginal de 17 ou 18 anos em nada se diferencie do marginal de 20 ou mais, e mesmo que seu aprendizado criminal nos presídios não seja maior do que o aprendizado fora, não é possível perder mais tempo discutindo idades.

          As ditas autoridades já estão devendo -- à sociedade, não aos criminosos em geral e monstros em especial. 


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sexta-feira, 26 de abril de 2013

Rolo compressor

                                        Por Eliane Cantanhêde(Folha de São Paulo)

          Olho vivo, porque estão votando restrições ao partido de Marina Silva e duas emendas constitucionais intrigantes. Uma retira o papel de investigação do Ministério Público e outra dá poderes ao Congresso para vetar algumas decisões do Supremo Tribunal Federal! 
          Quem são "eles", o sujeito oculto da frase - ou os sujeitos mesmo - no parágrafo anterior? Deduza o que quiser. O fato é que o Congresso, onde o governo, o PT e o PMDB têm imensa maioria, dá corda a projetos que prejudicam adversários ou têm caráter óbvio de retaliação. 
          Procuradores reagem à mudança no Ministério Público e os ministros Gilmar Mendes e Marco Aurélio reagiram duramente à proposta, aprovada na CCJ da Câmara, de submeter ao Legislativo as súmulas vinculantes e as ações de inconstitucionalidade da corte. 
          Marco Aurélio classificou de "retaliação" e não é exagero, depois do mensalão e da impressão digital do projeto: o autor é o deputado Nazareno Fontes, do PT do Piauí. Só não se sabe se é coisa da cabeça dele ou se ele só deu o nome a uma emenda feita pelo partido ou por partidários. De toda forma, é uma guerra inglória. 
          Sem oposição e alternância de poder, a democracia esmaece. 
          Sem a mídia, a sociedade brasileira não ficaria sabendo desde mensalão (revelado pela Folha) a salários de R$ 15 mil de garçons apadrinhados no Senado ("O Globo" de ontem). 
          Sem os procuradores, o senhor e a senhora não teriam ideia do que ocorre por aí, desde a denúncia do mensalão à mais alta corte até as contas atribuídas a Maluf em paraísos fiscais. 
          Sem o Supremo, não haveria a condenação de reluzentes mensaleiros do Executivo, do Legislativo e do setor privado, num enredo, aliás, que ainda não está concluído. 
          O ex-presidente Lula, a presidente Dilma, o PT, principalmente, e o PMDB, acessoriamente, devem ser mais cautelosos e evitar essa sofreguidão contra adversários e críticos. A ideia que fica é de desespero.

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segunda-feira, 15 de abril de 2013

HOMENAGEM FINAL - Os Jenipapeiríadas - Canto Final

Obrigado, João Bosco da Silva. 
Por cantar Francisco Santos em verso e prosa, 
por cantar tão lindamente e descrever de forma tão fiel a nossa história.
Também por ter nos dado a oportunidade de enriquecer nosso blog com tão belas postagens.
Tem sido muito gratificante pra nós esta parceria e esperamos que venham outras colaborações.
Com este último canto, encerramos a publicação do épico poema Os Jenipapeiríadas.


             H O M E N A G E M   F I N A L

                      I
                                        
             Falei de tudo e de todos
             de maneira impessoal,
             pois impossível seria
             a chamada nominal;
             por isso os nomes abaixo
             na homenagem final:
             - são nomes cujas razões
             têm várias motivações!
                                                   
                                     
                      II
                                        
             Licínio: juiz de paz;
             Elizeu: o construtor;
             Chodó: ponto de equilíbrio;
             Guarani: o educador;
             João Mariano: a semente
             do ginásio que vingou;
             Carleusa: nossa prefeita,
             que pra si tomou a empreita.

                       III

             Foi o comandante-em-chefe,
             grande líder natural,
             quando a terra não passava
             de paupérrimo arraial;
             crescemos à sua sombra,
             na virtude e na moral.
             Por ser da virtude escrínio,
             falo bem de seu Licínio.

                       IV

             Com o teu trabalho solo
             em prol da autonomia
             política da cidade,
             com lábia e muita porfia
             pequeno edil de grotão,
             te celebro em homilia.
             Hoje o povo te esqueceu:
             - benemérito E L I Z E U !!!

                       V

             Ao líder opositor,
             conselheiro meritório,
             sábio, lúcido, sereno,
             pelo seu contraditório
             na política da Terra
             qual diplomata notório:
             por valer mais que ouro em pó,
             bato palmas pra CHODÓ!!!

                       VI

             Já que outro prêmio não tenho
             pra esse cavaleiro andante,
             que percorria as fazendas
             oferecendo, ambulante,
             a jóia mais preciosa
             do seu saber cintilante:
             - GUARANI!, de capa e estola,
             te celebro, ó Mestre-Escola!!!

                       VII

             O pedido de um ginásio,
             de alguém tão desimportante,
             pra muitos um joão-ninguém,
             o faz aqui figurante
             na lista dos grandes homens,
             pois és, de fato, um GIGANTE!
             De ti me orgulho e me ufano:
             - oh, meu pai, JOÃO MARIANO!!!

                       VIII

             Sem emissão de juízos
             gerais que possa fazer,
             tenho que, por suas obras
             na esfera do saber,
             e por dever de justiça,
             o seu nome enaltecer.
             O Ginásio, o Livro, o Hino...
             CARLEUSA... mulher de tino!
                                        
                        IX

             Por ter a cidade o NOME
             do bondoso CORONEL
             DA GUARDA NACIONAL,
             pra ele tiro o chapéu,
             pedindo a Deus sempre o GUARDE
             na sua GUARDA no céu...
             E que Deus estenda o manto
             sobre a nossa  CHICO SANTO!!!

                        X

             Minha homenagem não fica
             nessas pessoas somente,
             pois a faço universal
             para abranger toda a gente
             honesta e trabalhadora
             versátil e competente.
             de minha terra tão boa,
             que Deus guarda e abençoa.

                        XI

             A história de Portugal
             é contada em OS LUSÍADAS,
             que lhe dão sentido e forma
             tal e qual as OLIMPÍADAS.
             Este é, pois, o meu propósito
             neste OS JENIPAPEIRÍADAS:
             - retratar nestes meus versos
             de minha gente os sucessos.
                                     
                      Teresina-PI, fev/2011


________________________________________
[1] Segundo a tradição, foram 9 pessoas que chegaram à terra. Digo oito para facilitar a rima. (N.do A.)


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sexta-feira, 12 de abril de 2013

"Grosso, mas eficiente"

                                                       Por Sandro Vaia

          Aquele homem grosso e inadequado, que tem dor nas costas, nunca senta e está sempre de pé atrás de uma cadeira dando esporro nos outros?

          Pois é, que homem ríspido e grosseiro. Não é um sujeito de bons modos. Não cursou mesmo nenhuma escola de etiqueta.

          Longe de ter a fleugma de um lorde inglês ou a finesse de uma dama vitoriana, o ministro Joaquim Barbosa é um rústico que incomoda quando condena mensaleiros, maltrata jornalistas e mais ainda quando maltrata juízes que representam os supremos interesses da importante classe dos juízes.

          Nesta semana ele montou uma armadilha para tornar pública a sua ira contra a criação de quatro novos tribunais federais que, segundo ele, custarão aos cofres públicos 8 bilhões de reais, e não trarão ao contribuinte nenhuma melhora no funcionamento do Judiciário.

          Recebeu uma delegação de representantes classistas da Magistratura- associações de juízes disso e daquilo - e desandou a criticar a maneira “sorrateira” como eles teriam apoiado a criação dos 4 novos tribunais, que provavelmente serão instalados “nalgum resort ou praia”.

          A palavra “sorrateira” abespinhou um dos magistrados, que tentou contestá-la e levou um cala-boca imperial do presidente do Supremo. Que acrescentou, criticando as delegações que o visitavam, que elas (as entidades) “não representam a Nação, mas apenas interesses corporativos”.

          O ministro de maus bofes seguiu adiante:

          “A Constituição não dá poderes à Ajufe (Associação de Juízes Federais). Isso não faz parte das exigências constitucionais. Não confunda a legitimidade que o senhor tem como representante sindical com a legitimidade dos órgãos de Estado. Órgãos importantes do Estado não se pronunciaram sobre a PEC. Vocês participaram de forma sorrateira na aprovação dela”.

          O fato é o seguinte: a PEC vai praticamente duplicar o número de tribunais federais existentes (os cinco atuais já empregam 36 mil funcionários), violar a Lei de Responsabilidade Fiscal e pouco ajudará a desafogar a Justiça. Só a defenderam as entidades classistas da Magistratura e a cúpula do Judiciário não foi sequer ouvida a respeito.

          Uma legítima farra corporativista. Haveria meios mais eficazes e mais baratos de melhorar a eficiência da Justiça Federal, como a digitalização dos processos ou a criação de câmaras regionais previstas pela Constituição.

          Acontece que o juiz “grosso e inadequado”, como o classificaram em nota de protesto as entidades de classe, preferiu fazer o barulho de quebrar os cristais e acordou o país para um assunto que permaneceria ignorado.

          Mal educado mas eficiente.



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quarta-feira, 10 de abril de 2013

Redução das Bancadas

          O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) redefiniu na noite desta terça-feira o tamanho das bancadas estaduais na Câmara Federal. O novo critério leva em consideração os dados do censo do IBGE de 2010, e, segundo o tribunal, vai fazer com que oito estados percam deputados federais, enquanto outros cinco vão ganhar novos representantes. As mudanças não vão trazer mudanças para a atual legislatura, e só vão passar a valer a partir das eleições de 2014.
          Ainda segundo o TSE, os estados que não concordarem podem questionar o novo critério no Supremo Tribunal Federal. Até a mudança decidida nesta noite, o número de deputados das bancadas da Câmara considerava dados da população de 1998. A divisão é feita levando em conta o número de cadeiras existentes na Câmara: 513, que são repartidas entre os 26 estados e o Distrito Federal.
          Pelo novo critério, os estados de Alagoas, Espírito Santo, Paraná, Rio de Janeiro, Pernambuco e Rio Grande do Sul vão perder um deputado cada um. Já a Paraíba e o Piauí perderão dois deputados
No caso dos estados que vão ganhar novos representantes estão Amazonas e Santa Catarina, que vão ganhar um deputado cada. Ceará e Minas Gerais vão ter mais dois deputados. Já o Pará é quem ganhou mais com as mudanças: vai ganhar quatro deputados, passando de 17 cadeiras para 21 na Câmara.


          O TSE não prevê mudanças em outros estados, como São Paulo. A reavaliação do tamanho das bancadas foi feito a partir de um pedido do Estado de Amazonas, que com a decisão acabou ganhando um deputado.
          Em maio de 2012, deputados amazonenses afirmaram que o estado deveria ter mais do que oito parlamentares na Câmara. Eles observaram que o Estado tem uma população maior do que Alagoas e Piauí, que tinham nove e dez deputados, respectivamente.
          A decisão de mudar o critério foi decidida por cinco votos a dois. Entre os que votaram contra a mudança, o ministro Marco Aurélio afirmou que não cabe ao TSE fixar as representações dos Estados para as eleições. A presidente do tribunal, Carmen Lúcia Antunes Rocha, também discordou, e disse que a Constituição não faz nenhuma referência à possibilidade de o TSE determinar a redistribuição das cadeiras na Câmara.
           Já o ministro Henrique Neves disse que a mudança acompanha as transformações na população, que cresceu 14% entre 1998 e 2010. A opinião foi compartilhada por Nancy Andrighi, Laurita Vaz, Henrique Neves, Luciana Lossio e José Antonio Dias Toffoli.

Fonte: Revista Veja.

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quinta-feira, 4 de abril de 2013

A POLÍTICA - Os Jenipapeiríadas - Oitavo Canto


                                 A    P O L Í T I C A
                                                     
                            I

                    Nascida como nasciam
                    as vilas pelo Brasil,
                    atrelavam-se ao poder
                    religioso e civil,
                    vezes aquele mandando,
                    tornando o outro servil,
                    porém usavam se unirem
                    pra juntos o compartirem.

                            II

                    Chamou-se Jenipapeiro
                    a vila recém-criada,
                    e por pertencer a Picos
                    ficou a ele atrelada,
                    tendo por representante
                    figura bem destacada
                    na cena regional
                    e até na estadual.

                            III

                    Mas por que Jenipapeiro?
                    Esclarece a tradição
                    que o topônimo se explica
                    pela grande profusão
                    dessa árvore na terra;
                    porém há contradição.
                    Discutível, em que pese,
                    alguém levanta outra tese.

                             IV

                    Nega o autor dessa tese
                    a existência em quantidade
                    de jenipapo entre nós
                    que desse conformidade
                    à razão que a tradição
                    exprime como verdade,
                    embora correlação
                    guarde a denominação.


                             V

                    Jenipapeiro seria
                    patriótica homenagem
                    aos Heróis do Jenipapo,
                    luta de audácia e coragem
                    de bravos piauienses
                    contra a lusa vassalagem,
                    enfrentando Fidié,
                    com sangue, suor e fé.

                             VI

                    O autor do postulado,
                    Mariano da Silva Neto,
                    informa  que essa batalha,
                    mesmo de modo indireto,
                    afetou a todos nós
                    no amor e no afeto.
                    Daí a justa comenda
                    pela sangrenta contenda.

                             VII

                   Passou-se o tempo... O arraial,
                   como uma entidade viva,
                   aos poucos foi-se livrando
                   da vida vegetativa,
                   inflamando-se a si mesmo
                   como o fogo que se ativa,
                   ganhando em seu ideário
                   doce sonho libertário!

                            VIII

                   Em virtude da dinâmica
                   da expansão familial,
                   embora ainda endogâmica,
                   foi coisa bem natural
                   surgirem as dissidências
                   da família original,
                   obra da democracia,
                   que engendra a cidadania.
  
                            IX

                   Fruto dessa dissidência,
                   no cenário despontou
                   Francisco Rodrigues Sales,
                   homem probo de valor,
                   edil pela  UDN,
                   o partido opositor
                   ao  PSD  mandante,
                   hegemônico, arrogante.

                            X

                   No outro pleito Elizeu
                   se elegeu vereador,
                   tornando-se lá em Picos
                   também nosso defensor.
                   Projetos de melhoria
                   defendeu e aprovou,
                   conseguindo algo de novo
                   para o seu sofrido povo.

                            XI

                   Com isso se fez preciso
                   Seu Licínio dividir
                   com seu irmão Elizeu
                   o encargo de dirigir
                   a política local
                   pra poder melhor servir
                   ao povo bom e ordeiro,
                   humilde, mas altaneiro.

                            XII

                   Quando não se resolviam
                   as pendengas por aqui,
                   remetiam ao Coronel,
                   em Picos, pra dirimir
                   e encontrar a solução
                   que viesse de servir
                   para as partes litigantes,
                   sem maiores agravantes.

                            XIII

                   Um papel, um documento,
                   qualquer caso de saúde,
                   o avio da receita...
                   A isso tudo, amiúde,
                   Seu Chico entrava em ação,
                   com total solicitude,
                   sem cobrar contrapartida
                   da gente desassistida.

                            XIV

                   Mas não ficava só nisso
                   seu zelo e dedicação:
                   - tinha o matuto o conselho,
                   o carinho, a atenção,
                   a hospedagem gratuita,
                   boa cama e refeição,
                   a quinta pros animais...
                   Tudo isso e muito mais

                            XV

                   Para os íntimos chamado
                   “Seu Chico”. Em Jenipapeiro,
                   ele era sempre lembrado
                   como o defensor primeiro,
                   sempre recebendo em Picos
                   o matuto mangalheiro...
                   Eis o retrato em moldura
                   do nosso “Chico Fartura”.

                            XVI

                   Por tais e tantos serviços
                   prestados pelo querido
                   Coronel Francisco Santos,
                   Elizeu foi escolhido,
                   em nível local, o líder
                   de seu povo agradecido,
                   tornando-se legatário
                   desse prêmio feudatário!

                            XVII

                   Decidido e arrojado,
                   Elizeu, com competência,
                   costurando simpatias,
                   angariou a anuência
                   do povo para o projeto
                   da futura independência;
                   faltava vender a idéia
                   aos deputados da Assembléia.
                 
                            XVIII

                   Correndo daqui pra Picos
                   ou pra capital do Estado,
                   confrontando lideranças,
                   convencendo deputados,
                   remando contra interesses
                   servis ou contrariados
                   - lutando quase sozinho,
                   foi preparando o caminho.

                            XIX

                   No dia da votação
                   na Assembléia decisória,
                   o prócer da região,
                   de forma conspiratória,
                   retirou-se do plenário...
                   Mas era tarde: a vitória
                   apontou a aprovação
                   de nossa emancipação!

                            XX

                   O outro lado chiou,
                   reclamou com espalhafato,
                   bradando ilegalidades
                   havidas naquele ato,
                   prometendo aos partidários
                   logo reverter o fato...
                   Falação de derrotado
                   contra fato consumado.


                            XXI

                   Toda essa motivação
                   de protesto e rebeldia,
                   é preciso que se diga,
                   toda ela residia
                   no fato de o perdedor
                   encontrar-se em minoria,
                   portanto alijado e assim
                   fora do político butim.

                            XXII

                   A difícil independência
                   arduamente conseguida,
                   trouxe um sentimento estranho
                   à pessoa embevecida,
                   o prazer de descobrir
                   novo sentido pra vida
                   - era o Homem da Caverna
                   ao sol da era moderna.

                            XXIII

                   Espera de longo prazo
                   vira, enfim, realidade,
                   sentimento messiânico
                   por mais ampla liberdade:
                   - mãe-Picos agora posta
                   no mesmo pé de igualdade,
                   pois rompera-se, afinal,
                   o cordão umbilical.

                            XXIV

                   Instalou-se o município
                   com toda festividade;
                   por todo lugar sorriam
                   o povo e as autoridades,
                   todos orgulhosos com
                   o novo status de cidade,
                   embora muito faltasse
                   para que roda engrenasse.

                            XXV

                   Com isso aquela faceta
                   de ingenuidade e pureza
                   se foi aos poucos sumindo
                   nos palpos da esperteza,
                   porque o homem se vende
                   bastando que em sua mesa
                   se ponha um prato de arroz
                   ou um belo baião-de-dois.

                            XXVI

                   Cargos, verbas e empregos
                   viram moeda de troca,
                   a corrupção a comer
                   o caráter como a broca
                   na madeira fraca ou podre,
                   processo que desemboca
                   na máxima que hoje concebe
                   o “é dando que se recebe”.
                           
                            XXVII

                   Assim a fidelidade
                   ao líder e ao partido
                   virou interesse vil
                   de comprador e vendido;
                   caráter se fez valor
                   completamente esquecido...
                   No bloco dessa fanfarra,
                   muita gente entrou na farra.

                            XXVIII

                   A partir desse momento,
                   com a alma merencória,
                   em atenção aos dez justos
                   salvados da vil escória,
                   faço correr as cortinas
                   sobre os anais da história,
                   pois me nego de narrar
                   tragédia nada exemplar.

                            XXIX

                   Apesar da subversão
                   dos essenciais valores,
                   a nossa emancipação
                   merece canto e louvores,
                   pois sem ela o IDH
                   dos nossos indicadores
                   seriam de mais miséria,
                   aviltante, deletéria.

                            XXX

                   A passo de tartaruga,
                   iam os órgãos se instalando,
                   os municipais primeiro,
                   os do estado secundando,
                   os federais, como sempre,
                   a conta-gotas chegando...
                   O ensino foi o setor
                   que mais depressa medrou.

                            XXXI

                   A nossa primeira escola,
                   chamada Casa Rural,
                   só chegou em 35,
                   quando o modesto arraial
                   transformou-se em povoado,
                   muito elevando o moral
                   de sua gente simplória
                   não obstante finória.

                            XXXII

                   No ensino das primas letras,
                   destaco em primeira linha
                   mestres-escolas amados
                   como dona Mariinha,
                   Luiz Chaves e Da Luz,
                   Carmosa, minha madrinha
                   e Mundico de Boronga,
                   de erudição fina e longa.

                            XXXIII

                   O maior de todos eles
                   retirou da ignorância
                   desde marmanjos barbudos
                   a nenéns da pré-infância,
                   a todos lecionando
                   sem orgulho e sem jactância.
                   Nos haveres, sempre pobre:
                   - MIGUEL de coração nobre!

                            XXXIV

                   Certo dia, o secretário,
                   gestor da educação,
                   em visita ao município,
                   recebeu de um cidadão,
                   lavrador desenxabido,
                   porém muito pé-no-chão,
                   um insólito pedido
                   que o deixou surpreendido.


                            XXXV

                   “Um ginásio pra esta terra
                   peço pro senhor trazer;
                   como aqui só há o primário,
                   não preciso lhe dizer
                   que o jovem, ao concluí-lo,
                   fica navios a ver,
                   pois ninguém pode botar
                   filhos fora pra estudar”.

                            XXXVI

                   O tempo correu... as coisas
                   também nos trilhos correndo;
                   conforme o eclesiastes,
                   tudo foi acontecendo
                   nem antes e nem depois,
                   mas na hora... E assim sendo,
                   o “Cristo REI” foi criado
                   após seis anos passados.

                            XXXVII

                   Toda idéia é qual semente
                   no solo do agricultor.
                   Se a criação é de Deus,
                   Deus, então, é o criador.
                   Se o pedido de um ginásio
                   partiu de um agricultor,
                   a Carleusa a gratidão
                   pela sua instalação.


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