quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Crônica – Dia de Ano Novo – João Bosco da Silva


          DIA DE ANO NOVO. Confraternização no mundo ocidental. O ano velho entregando ao ano novo sua carga de alegrias, realizações, esperanças e - decepções! Marcava também o dia de ano o início de novo ciclo anual de trabalho, com a subida de todos para seus retiros de inverno, no alto das serras.
          Dia de ano novo ou simplesmente dia de ano era geralmente um marco na vida do jenipapeirense. Dia festivo, dia de encontro, dia de afilhado tomar a bênção aos padrinhos e esperar, em contrapartida, um presentinho, uma lembrancinha qualquer. Era a tradição, ou mais do que isto: era obrigação recíproca.
          Para mim havia sempre uma esperança. Uma certeza, aliás. Que meus padrinhos, fosse um, fosse o outro, jamais falhavam. Pelo menos um deles "molhava" a mão do afilhado. Não que eu esperasse bons presentes: por exemplo, um carneiro ou uma bezerra, como era o caso de alguns amigos meus. Não, nada desse gênero. Que meus padrinhos eram pobres. Contentava-me com a moedinha. A infalível moedinha - amarela, mágica - com que comprava as gostosíssimas mariolas na bodega do velho Boronga.
          Velho bom aquele! Gordo, papadas se derramando no peito, barriga por acolá de grande, voz cavernosa de tão grossa. Tinha sempre um dichote, um piparote ou uma cacholeta a dar.
- Toma, moleque, a mariola.
          De quebra, um agrado. Sempre um bombom ou dois. E tome outra cacholeta. Velho bom! Morreu em 1949, num dia de grande cheia do rio. Lembro que fiquei trepado na cerca da rocinha para ver o caixão passar. Passou pelo outro lado, porque o rio não dava passagem. Assim, não pude ver meu amigo em seu caixão cor de vinho, debruado de fitas brancas.
          Boronga! Uma lembrança que ainda me comove.
Dia de ano era isto: os destão (dez tostões) de meu padrinho Jaime eram sagrados. Os de Bió, nem sempre. E eram sempre menos, às vezes só quinhentorréis ou um cruzado. Também, era só padrinho de crisma! E era irmão, não carecia de levar tão a sério a tradição.
          Esperado, bem-vindo, bendito dia de ano. Que gostosas mariolas devorava! Por conta daquela compra anual, até ganhava bombons de brinde. Tão diferente d'agora! Durante anos - quatro, cinco, sei lá quantos? - com as mesmas moedinhas comprava as mesmas mariolas. Meus filhos, anos depois, embora não entendendo o fenômeno da inflação, comentavam entre si, certo final de ano:
- Será que o tio Mariano este ano vai chegar aos 200?
          Vejam só! Aqui já não eram dez tostões ou quinhentos réis. Eram 200 cruzeiros. No ano anterior o tio os havia agraciado com 100 cruzeiros; 100 para cada um. Daí o comentário, ano depois. Daí o sentido do aumento. Porque o sentiam na aquisição das próprias guloseimas.
          Primeiro de janeiro era, também, um divisor de águas, pelo menos lá em casa. Marco constante no ciclo anual dos acontecimentos, dia de ano era o encontro de todos os filhos e netos na comunhão geral, na confraternização das bênçãos, nas palestras descontraídas, no joguinho de cartas dos adultos - bisca ou três-sete -, na correria desenfreada de tantos primos se encontrando pelas salas, varanda, quartos escuros, ou a treparem nos velhos pés de trapiá do Alto.
Já o dia seguinte era de recolhimento, de tristeza. Tradição de muitos anos, logo cedo rumávamos para a igreja, onde era rezada a visita de "inteiro" de mais um ano da morte de Maria, falecida nos idos de 1945. Já a visita à cova não se fazia mais. Cemitério longe, muito o que fazer na preparação da mudança, logo mais à tarde. Nos finados, aí sim, uma reza, umas flores de flamboyant, uma vela ao pé das covas, em intenção das três almas: de minha irmã Maria, de minha mãe Sarica e de madrinha Cota, todas ali juntinhas, emparelhadas.
          Invariavelmente, na tarde desse dia era a mudança, a subida para a serra, para o retiro no nosso amigo e alegre Viroveu, onde passaríamos os próximos seis meses.
A mudança para as serras era acontecimento comum na vida da comunidade. Do meu conhecimento, poucas eram as famílias que não se mudavam. Houve tempo em que só ficavam na cidade Antônio Moisés, Batista, Heli de Zé Belchior, a velha Libânia e Feliciana. Além, é claro, das poucas "raparigas" da Rua da Puxada.
          Praticamente todo mundo possuía um pedacinho de terra para plantar feijão, milho e mandioca. Por mais retalhada que estivesse a terra, sempre sobrava um pedacinho de chão para cada um. Eram todos pobres, poucos se destacando como ricos ou remediados, mas não tão pobres que não tivessem "onde cair morto".
Assim, na época da invernada, todos subiam para seus retiros, distantes do povoado entre uma a três léguas, no altiplano dos chapadões de boas terras, onde a lavoura era exercida com amor e dedicação. A mudança tinha o sentido econômico de evitar perda de tempo nos deslocamentos diários entre as serras e a cidade, ou a Ribeira, onde ficavam as residências de verão, bem como, e principalmente, o de usufruir melhor de toda a abundância que a temporada oferecia.
          Ao lado da terra, cada pai de família possuía também suas vaquinhas de leite, em maior ou menor quantidade. Daí o queijinho para comer com mel de abelha nos "dias grandes" da semana santa. Queijinho sempre provado na hora da feitura, à beira da panela, gostoso experimento de adultos e crianças. Raro em outras épocas do ano, constituía-se almoço de muito luxo e valor, nobre refeição de toda sexta-feira santa. O leite, a coalhada, a nata, a manteiga, a melancia, o maxixe, o feijão e o milho verde eram produtos de não menos valia em nossa rotineira dieta alimentar, no tempo da estação das chuvas.
          Tudo cheirava a fartura.
          Não obstante tudo isso, meu coração de menino apertava-se com a aproximação do inverno. Inverno significava trabalho: plantar feijão, plantar mandioca, plantar milho. Arre! Eram serviços rápidos, em uma semana estariam terminados. Mesmo assim, por essa semana de trabalho, eu maldizia o Viroveu, com  todas  as  suas  "pragas". Maldizia  pelo inverno,  pois havia  relâmpagos  e trovões brabos, de que eu tinha pavor! Maldizia pelas frieiras, que tanto incomodavam durante a noite. Lembro bem as mezinhas receitadas por meu  pai. De manhãzinha, ainda antes do nascer do sol, ele sempre ia me acordar para que eu fosse colocar o pé sob o jato de urina de uma das vacas. "Só serve o primeiro mijo, que vem quente e chegado no sal" - justificava o velho. O banho nas pernas era inevitável porque o jato, ao tocar no pé, suspenso a meia altura, espadanava urina para todo lado. À noite, era a compressa morna de folha de cabaça ou, na falta desta, de folha de abóbora sobre os pés inchados. Até que era gostosa a coceira, passados os primeiros momentos de quentura, quando, então, eu passava a fazer suaves massagens em torno dos dedos abertos, grossos de pus. E, finalmente, maldizia a conjuntivite, que a gente chamava dordói, com suas remelas. Para curá-la, usava-se o leite de peito ou, na falta de mulher em período de amamentação, o colírio Moura Brasil, doedor pra peste.
          Afora isso, a vida era muito boa.
          Tão poucos os serviços no Viroveu! Tirante essa semana terrível, trabalhar duro mesmo só em mais três ocasiões: nas apanhas de feijão, na carregação do paul para o plantio do alho e nas farinhadas.

          Com o tempo, até esses servicinhos leves acabaram, em vista da perspectiva de eu ir para o estudo em Jaicós... pra ser “doutor”, conforme augurava seu Loura...


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Cultura&Arte - Cronica - João Bosco da Silva



O DILIGENTE LAVRADOR-MIRIM

      EM CERTA BOCA DE NOITE, entre fins de outubro e começo de novembro (de que ano seria...?), conversava-se ao terreiro, como de costume. De repente, seu Loura, o patriarca do clã, pede silêncio e põe-se à escuta, espreitando o horizonte. Levanta-se, observa, vai à ponta do terreiro, quase à entrada das vassourinhas.
          Engana-se.
         Retorna, volta a sentar-se na cadeira, lado esquerdo da porta, como de costume. Daí a instantes, outra vez a mesma atitude. Acha que agora viu. Sutil claridade piscando, rápida, ainda longe. Apura o ouvido e a vista, enquanto põe mais uma masca de arapiraca na boca.
         Nada não, engana-se de novo. Dá uma cusparada e retorna.
         Meia hora depois, quando muito, a mesma coisa. Procura ouvir ou enxergar através da noite de breu, como se buscasse algo além do horizonte fechado à distância pelas pontas trespassadas das colinas no “esse” do vale, ao nascente. Agora nuvens escuras subiam ao céu, apagando as estrelas, prenúncio que não observei, não obstante minha latente ansiedade.
         - Rezar o Terço, anuncia o Velho. E vai logo entrando.
         Entramos atrás, todos, para rezar o Santo Terço, obrigação / devoção infalível de toda santa noite. Daí a uma hora, mais ou menos (terço lá em casa era comprido!), finda-se o ato religioso. Quantos padre-nossos e ave-marias a quantos mortos e orações outras de encerramento? Um padre-nosso pra alma da  finada Sarica (minha mãe), outro para a finada Maria (minha irmã mais velha), para o finado Dedé (tio), e para uma infinidade de outros tantos finados, todos parentes e amigos. Após a “Salve Rainha” e o “Senhor Deus, misericórdia”, encerrava-se a reza, com todos piedosamente ajoelhados – amém!
         Espiritualmente confortado, sai novamente seu Loura ao terreiro, para de novo perscrutar o tempo. Demora-se um pouco e, ao retornar, traz a boa nova:
         - “Relampo” no nascente!
         Levo um bruto susto!
Sempre assim, nunca me acostumei, desde que peguei no pesado. Todo ano, aí por meados de outubro (as chuvas antigamente chegavam mais cedo), batia-me no peito a inquietação, o receio pelo início dos trabalhos. Naquela noite porém, não obstante a ambivalência de sentimentos, a “boa nova” pegou-me desprevenido. Nem percebera o sumiço da lua, tão animada que estava a palestra com Lista.
         O coração disparara. Dia seguinte seria a plantação de feijão no Viroveu, impreterível, coisa certa, porque Seu Loura jamais se enganava. Eram anos e anos de experiência observando os sinais do céu. Não seria dessa vez que iria errar. A maneira como se expressou, a ênfase no tom de voz conferindo a certeza, o júbilo demonstrado no anúncio não deixavam dúvidas. A chuva viria.
         E veio mesmo, infalível, forte, aterradora. Com ela, o detestado serviço. Pior que rapar paul, não obstante as ferroadas das formigas pretas e o perigo das jararacas e corais. Não gostava de plantar feijão. No Viroveu, de areia leve, havia os tocos a rasgar os pés; na beira do rio, barro massapé pegajoso e pesado: uma desgraça! Dava íngua, febre: escambichava-me. A dor nos quadris e virilha persistia por semanas.
         Daí o medo.
         Por isso eu rezava, rezava sempre, como naquela noite. Enquanto a chuva caía no telhado, puxava terços e rosários e clamava com fervor pelo meu anjo da guarda e até por santos que não eram propriamente das minhas relações. Fixara-me depois, por motivos óbvios, em duas protetoras poderosas, assim escolhidas conforme o “ministério” de cada uma: Nossa Senhora (incluíam-se todas: a das Mercês, a do Amparo, a do Rosário etc) e Santa Bárbara.
         À Nossa Senhora, por ser a mãe de Jesus, rogava para que fizesse parar a chuva para proteger do pesado plantio um filho órfão e desvalido, de apenas oito aninhos. Para que não chovesse tanto, para deixar para o outro mês, quando eu estaria mais “preparado”. Chovesse na outra semana, ou dali a dois dias. Aí seria domingo, dia de guarda, e não se trabalhava. E então na segunda feira a terra talvez estivesse seca, não se prestando ao plantio. À santa Bárbara pedia proteção contra raios e trovões, tão medonhos e assustadores.
         Teve jeito não. A chuva veio, não do jeito que eu queria, mas ao modo dela. Ou as santas não gostavam de mim ou minha reza era tão baixa que elas não podiam ouvir. “Mas me ensinaram que a gente pode rezar no coração e mesmo assim ser ouvido lá em cima” – pensava comigo. “Logo, eu devo ser um grande pecador, e mereço castigo, já que Santa Bárbara não me atende” - concluía. E, então, redobrava nas rezas, buscando não apenas os padre-nossos e as ave-marias, mas outras mais poderosas e profundas, como  a “Salve Rainha” e as partes que eu sabia do “Santo Ofício de Nossa Senhora”.
         A chuva veio mesmo naquela noite, valente, braba, com raios e trovões enceguecendo e trombeteando no espaço, como se fora o próprio apocalipse rasgando céus e terra em todos os horizontes. Era inútil enrolar a cabeça no grosso cobertor e embrulhar-me na rede. O fragor da tempestade sobrepujava quaisquer cuidados.
         Mais de cinco horas de chuva torrencial. Já se faziam ouvir, fragorosamente, os riachos botando, barulheira infernal, carregando paus e pedras, garranchos e obstáculos em seu caminho de areia. Caudatário de muitos riachos, não tardaria que também o rio começasse a estrugir e a roncar, levando de roldão, em sua fúria demoníaca, cercas e entulhos, canteiros e leiras e os montes de areia resultantes das arrasações para o plantio do alho, há pouco tempo colhido.
         Gostoso era ficar-se ouvindo o pipocar dos trovões no alto de nossas cabeças e imaginá-los a rolar nos céus eletrizados até que a fúria dos seus elementos se transformasse em longínquos e inofensivos clarões e em sonoros e surdos ribombos a estremecer no bojo da terra abençoada. Espetáculo realmente bonito de se ver, não fora o meu espírito pusilânime e aberto aos terrores da mãe-natureza.
         Falharam todas as minhas estratégias rogatórias. Manhãzinha, o tempo estava esplêndido! Cheiro de terra molhada no ar, como se houvera um longo e benéfico ato amoroso entre o céu e a terra agora intumescida.
Eis-nos a caminho do Viroveu.

                   Ei-lo montado no seu jumentinho,                 
                   enxada  às costas, rumando a caminho
                   do nosso amigo e alegre Viroveu;
                   contente segue, vai cantarolando,
                   nesta simpleza rude murmurando
                   preces ao Criador, porque choveu.

                            E já parece ver-se no roçado,
                            buracos a abrir no chão molhado
                            (e eu atrás, feijão a semear);
                            e embevecido assim em seus cismares,
                            surra o jerico, içando pelos ares
                            o chicote. E não tarda de chegar.

         Não tarda de chegar. Vou de coração pequenino. Mas vou-me consolando, dando um jeito de adiar o serviço, como à espera de um milagre. Satisfazia-me ainda estarmos passando pela Serra de Antônio Mole. Depois, pela de Quincó de Chico. Faltava ainda a de Mané Ilia, nosso primo. Depois...
         Não havia mais depois. Nem escapatória. Estamos chegando. Meu pai desapeia. Abre a porteira. Passamos.
         Ainda uma leve esperança de adiamento: a caminhada até a roça. Quem sabe uma estrepada, uma cobra... “Virgem Maria, Deus que me livre e guarde!”
         Para desconsolo meu, a roça a ser plantada em primeiro lugar é a nova. Sabedoria e experiência do Velho. Terra de roça nova, recém-queimada, não permite bem a penetração da chuva. Daí plantá-la primeiro, antes que o molhado desapareça. Os terrenos de capoeira podem esperar porque absorvem a água em maior quantidade, permanecendo molhados por mais tempo.
         Desgraça!
Era agora. Os afiados tocos me esperam...
         “Nas horas de Deus, amém” - diz seu Loura. – “Vamos plantar nossa bendita rocinha. É como eu sempre digo: você, João Bosco, tem mãos e pés abençoados, tudo o que você planta e semeia nasce bonito, vistoso!”
         E bate a enxada no chão, abrindo a primeira cova.
         Não vou dizer que o elogio me cativou. Xingo e rogo mil pragas, baixinho. Mas vou semeando.
        

até as primeiras águas do ano seguinte, quando o “diligente” lavrador-mirim estará de novo em ação.




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sábado, 24 de dezembro de 2011

Cultura & Arte - Crônica - Francisco Miguel de Moura

UMA CRÔNICA DE NATAL


   Francisco Miguel de Moura – Escritor, membro da Academia Piauiense de Letras



          Natal é somente um dia por ano. É festa de presentes. Acontece que, neste tempo de consumismo brabo, não há somente um dia, mas um mês de Natal, para que o comércio venda mais, o governo arrecade o que não conseguiu durante todo o ano e as administradoras de cartão de crédito aumentem o assédio aos pobres e endividados. Deveria ser o dia de Confraternização Universal, do humanismo. Como no Brasil e, de resto, no mundo, o dia da Confraternização Universal é o 1º de Janeiro. Por causa das mudanças do calendário, que pouca gente sabe explicar, é que o ano cristão começa em 25 de dezembro e não no 1º de janeiro, em consonância com o ano civil. Restou conservá-lo no dia considerado do nascimento de Jesus de Nazaré. Em homenagem à família de José, Maria e Jesus, o Natal é o Dia da Família.  Consta que Jesus nasceu numa manjedoura e vieram algumas pessoas visitá-lo, entre as quais os três Reis Magos, mas a tradição não diz de que países eles eram reis. José estava indo, com a família, para o recenseamento obrigatório que o governo realizava em Belém. Era um carpinteiro pobre, não tinha como descansar numa pousada. Chegando a hora de Maria dar a luz, foi parar numa estrebaria onde havia burros, jumentos, ovelhas, aves, pássaros e plantações. Só isto já é suficiente para uma confraternização com a natureza. E que fazemos nós, hoje, por nossa casa? É tempo de pensar na conservação do planeta. Também, a não ser um reduzido número de católicos, ninguém lembra de Jesus nem visita as igrejas ou as “lapinhas” que outrora se faziam, onde as pastorinhas cantavam, alegres, pelo nascimento de Deus Menino.  Quem reinventa um presépio? Quem se lembra dos animais? Quem olha o céu, a estrela, as estrelas? Poucos vão à missa, muitos vão aos shopping-centers para comprar bugigangas para os filhos, e também para os parentes e aderentes, por ocasião da Ceia de Natal. Produtos importados do oriente, da China, principalmente os mais baratos – o que significa que o falso sistema socialista, instalado lá, age como capitalista mesmo, pagando mal aos empregados para exportar mais barato, fazendo concorrência ao verdadeiro capitalismo – o de cá, do ocidente, onde o Papai Noel reina soberano - ele, o símbolo perfeito do capitalismo consumista.
Natal é tudo de mentirinha.
Entrei numa dessas superlojas onde se vendem presentes para crianças e fiquei estupefacto. Como escritor e poeta, sensibilidade aguda, senti-me nervoso e doente vendo todo aquele amontoado de bonecas barby e personagens de toda natureza, inclusive os simbólicos como o homem aranha, a boneca  emília, o visconde de sabugosa, o saci, o lobisomem, dinossauros, astronautas  e não sei mais o quê, tudo empilhado, uns sufocando os outros, ou jogados nas prateleiras, aos montes, caídos estatelados e emborcados. O negócio é dar presentes materiais de pouca valia, e recebê-los. É de praxe, hoje, o “amigo oculto”, brincadeira de antes da ceia de Natal. Faz-se um sorteio de nomes do grupo para ver quem dá presente a quem. E os nomes ficam em segredo para que quem vai receber não saiba de quem receberá, mas quem vai oferecer saiba a quem vai oferecer. Todos oferecem e todos recebem um presente, e as despesas com o item natalino diminuem sensivelmente. Nada muito alegre. Diante da tevê ouvem-se músicas atuais e a conversa continua em tom alto, de maneira que ninguém entenda ninguém, bastando que fiquem com a impressão de que foram ouvidos. Alguns folheiam velhos álbuns de fotografias ou abrem um vídeo no computador para lembranças melancólicas do passado ou para mangar dos feios e das fotos mal feitas - enquanto comem e bebem.  
“Todos os começos sãos flores”, como dizia minha mãe.
          O dia seguinte é só pra curtir os excessos e a solidão. De tudo sobram algumas fotos de registro, cartões com dizeres sempre iguais recebidos e, no outro dia, jogados na cesta, ou o remoer pedaços de frases ditas por alguém, do que não gostou. Em família há diferenças que nem sempre são caladas, passados os primeiros momentos da chegada à festa.
          No começo, a casa estava cheia. Agora está vazia e, muitas vezes, os próprios corações. Festa de alegria? Nem sempre. Brigas, desgostos, notícias dolorosas de doença ou morte, tudo pode vir à flor da conversa.  Os egoístas não se incomodam com isto. Os poetas é que não se conformam e ficam a escrever o que sonharam – natais tão diferentes, com emoção, lirismo e memória. E chegam a inventar símbolos como o do peru, que, para não ficar triste, morre de véspera.


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quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Quem com ferro fere...

    
              No ultimo post relacionado com a politica local "O Poder em Jogo" , analisamos a importância e as consequencias da adesão de Valdinar Lima as fileiras da oposição. Hoje, por uma questão de justiça e para mantermos a equidade no conteúdo do blog, trataremos de um fato semelhante que vem acontecendo, apenas os personagens estão tomando posições diversas, se antes, era da situação para a oposição, hoje o movimento se inverteu.
              Quem vive em Francisco Santos sabe da importância que Sandoval representou para Tata na politica local, pela defesa intransigente de seu líder politico, colocando-se em muitos momentos da vida em posição contrária a sua familia. Hoje ele toma uma posição que fere frontalmente os interesses politicos de Tatá, pelo menos e a avaliação que fazemos deste fato. Os reais motivos, somente com o decorrer do tempo, teremos esclarecidos. O que é certo neste momento, Sandoval alia-se a situação e deixa as oposições com uma enorme interrogação.
              Bem sucedido no ramo empresarial, carismático, bem relacionado e com um grande espírito de liderança, seguiu sempre com um rigor canino todas as orientações políticas de Tata, seja defendendo as postulações de candidaturas do próprio, como também sempre defendeu as candidaturas majoritárias e proporcionais por ele apoiadas. Sendo inclusive, um dos maiores financiadores das ultimas campanhas eleitorais, talvez o seu maior financiador na ultima eleição.
              Na verdade o tema da postagem não seria Tata, mas para abordarmos este assunto precisamos inseri-lo, devido a ligação umbilical que Sandoval sempre teve com o mesmo. Também porque acreditamos que se há rompimento de uma relação, só poderia ser com Tatá, pois ninguém corta relações com quem nunca as teve.
              Todos sabemos quais as razoes em tese de quem toma decisões de sair de determinado grupo politico, a principal delas, a insatisfação. E ele vinha manifestando publicamente a sua insatisfação com o seu então líder politico, pois com a derrota nas eleições de 2008, Tatá mudou-se para Teresina e se ausentou da comunidade, dando pouca satisfação aos seus eleitores e muito menos atenção ainda aqueles que se propuseram a colaborar com a sua campanha. 
              São acontecimentos que a história não desmentirá jamais, pois é fato, Sandoval contribuiu e muito com todas as conquistas politicas de Tatá, sempre defendendo os seus pontos de vistas. Numa relação alicerçada na amizade pessoal e nos laços de parentesco. 
               O deterioramento das relações tem outras causas e um fator preponderante foi a sua aproximação com Edson e Luís José, onde todos os seus cabos eleitorais se mobilizaram, incentivados pelo mesmo para viabilizar uma aliança, que não deu certo. Mas teve como efeito essa aproximação do seu eleitorado com as lideranças da situação, que neste momento vem conseguindo aliar-se a muitos deles, com uma frequência muito grande. Vide os casos de Luis Eduardo, Manoel Tenório, o ex-vereador Dodô e outros.
              O impacto inicial da adesão de Sandoval desestabiliza momentaneamente a campanha da oposição, pelas ligações de parentesco que tem com Tatá e com Carleusa, também pelo prejuízo que poderá causar num futuro próximo. Pois todos que tomaram estas posições, sofreram criticas duras, muitas vezes injustas, e estas criticas sempre se voltaram contra os críticos, pois os candidatos majoritários no afã de minimizar os prejuízos causadas terminam sendo penalizados pelos seus próprios argumentos.
              Qualquer semelhança com o caso Valdinar Lima, não terá sido mera coincidência. É a velha história se repetindo.

  
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segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Revisao...Afinal


          A revisão eleitoral tão anunciada, finalmente esta chegando. Sob o pomposo nome de sistema biométrico de votação, mas que na realidade é uma revisão eleitoral profunda, pois todos os eleitores domiciliados em Francisco Santos terão que comparecer a sua Zona Eleitoral sob pena de ter cancelado o seu título eleitoral.
    Será instalada no próximo dia 15 de dezembro de 2011, às 15:00 horas no Fórum Desembargador Vidal de Freitas, comarca de Francisco Santos - PI e atendera os eleitores ate o dia 23 de Dezembro, sendo então suspensos e reiniciados os trabalhos no dia 03 de Janeiro, encerrando as atividades no dia 15 de Fevereiro de 2012.
    Serão necessários documentos pessoais com fotografia e comprovantes de residências ou que comprovem vínculo com a terrinha, tais como: contas de energia, água, telefone, comprovantes do INCRA, notas fiscais de compra, talão de cheques, carnes de pagamentos em que constem nome e endereço, etc., etc., etc. Um detalhe relevante, todos estes documentos terão que ser recentes, correspondente ao período do final de 2010 a setembro de 2011.
    É importante observar que esta revisão foi fruto de uma reivindicação da atual oposição, que em outro momento da vida política de Francisco Santos, sendo então situação, sentiu-se altamente prejudicada com a revisão de outrora. E agora procura dar o troco na atual situação.
    A implantação do sistema biométrico de votação em tese, beneficiara as oposições, pois antecipara a campanha, obrigara a situação a ir mais uma vez em busca dos eleitores "estrangeiros" que terão de provar o vinculo eleitoral. 
    Por outro lado, a situação teoricamente tem alguma gordura pra queimar, pois venceu as ultimas eleições com 718 votos. E também  poderá tirar proveito desta revisão, podendo fazer uma avaliação profunda do atual quadro da política local. Podendo diante do desenho político do momento, fazer os investimentos necessários conforme as suas conveniências.
   Este será, sem sombra de dúvida, um final de ano muito movimentado. Pois, os partidos e seus possíveis candidatos mobilizarão seus familiares, amigos e futuros eleitores para alem de participarem dos tradicionais festejos de aniversário da cidade e o também já tradicional Chico Folia, participarem da revisão eleitoral.



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sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Cultura & Arte - Crônica de João Bosco da Silva

O BOLO DE Botiqueira

Por: João Bosco da Silva 

          OS FESTEJOS religiosos na pequenina Jenipapeiro eram acontecimento ímpar em minha vida e, de resto, na vida de todos os garotos de meu tope. Os motivos principais de tanta euforia eram os bolos de Botiqueira, com que os nossos pais nos brindavam na noite do leilão, e a queima dos fogos - rojões, carretões e baterias - que Batista, o velho fogueteiro, fazia estourar durante as noites de novena e no dia da festa-de-guarda.
     Chiiiiiiiiiii........................................... puuuuummm!

    Nada mais empolgante e ao mesmo tempo aterrador que ver aquele rabo de fogo serpentear no espaço soltando fagulhas para todo lado e estourar nas alturas! Depois, era a grande disputa pelo foguetão queimado. Só os mais valentes conseguiam o troféu, na corrida ou no braço. 
   Para a população em geral, essas festas constituíam uma quebra da rotina, uma breve interrupção na trabalheira do campo, um refrigério para todos, fosse no campo espiritual, fosse na parte profana. As novenas antecipavam parte dessa animação, cujo auge se dava na véspera da missa cantada, com a realização do grande leilão e quermesses e bancas de comida por toda parte. A venda de bebidas, nesse tempo, ainda não fazia  parte do grande marketing  das festividades  religiosas, tampouco o caráter argentário era tão forte como agora. Isso quer-me parecer que tais celebrações eram mais autênticas em sua pureza cristã.
   O adro da pequena capela enchia-se de gente. Mulheres pias, que iam prestigiar o acontecimento com rezas e cantos; sisudos senhores, que iam colaborar na arrematação das jóias do leilão; rapazes e moças, que iam para aproveitar a oportunidade de uma paquera, arriscar um começo de namoro ou, até quem sabe, contratar casamento para o queima do dia seguinte, uma vez achassem noivas dispostas à arriscada aventura. E, finalmente,  a  meninada, que ia para se fartar nos doces e bolos em que eram exímias Biluca, Carmina e Botiqueira, sendo esta a melhor boleira da região.
   Os festejos religiosos eram um cromo da vida simples, bucólica e ingênua, um congraçamento em que toda a população se irmanava, cada qual metido em sua fatiota, procurando fazer bonito.
   - Se você levantar a saia daquela moça ali, lhe dou um bolo - prometia-me Fulano de tal, querendo se vingar do "fora" que levara da senhorita.
  O Fulano e a pretensa vítima de sua brincadeira de mau gosto haviam mantido, quando adolescentes, um amor platônico, aquele tipo de romance em que todos os sonhos são possíveis, todas as juras são feitas e todas as promessas assumidas. Moça pobre, talvez a primeira a sair para estudar fora, voltava agora em plena forma física, esbelta, elegante, deveras bonita, já cursando o 4º ano de Psicologia. O rapaz, empolgado, tentou reatar aquele romance de sua adolescência, sendo rechaçado em sua ousada investida. “Arrastara mala”, como se dizia então, quando uma jovem recusava oferta de namoro. O rejeitado, apesar de extrovertido e brincalhão, ficou intimamente ressentido e passou a considerar o episódio a suprema humilhação de sua vida. Daí a tentativa de ridicularizar a jovem, numa forma de vingança deselegante e mesquinha.
- Vá, vá - dizia ele, empurrando-me no rumo da moça. - Levanta a saia dela e corra; quando você voltar, lhe dou o bolo.
- De qual? - perguntei, meio desconfiado.
- Daquela ali, olha! Tá vendo? Daquela.
- Ah, de ........? Tou vendo.
O prêmio era por demais tentador. Os bolos e doces eram o fascínio de todo garoto. Principalmente os bolos de Botiqueira, inegavelmente a melhor boleira da cidade. Suas roscas e bolos de goma eram uma delícia; de dar água na boca os seus pães-de-ló e pudins. Até mesmo os adultos ficavam se babando à sua visão.
   Fiquei numa dúvida terrível, dividido entre a vontade de saborear a apetitosa iguaria e o medo de alentada sova, caso meu pai viesse a saber do malfeito. Procurei, por isso, adiar a decisão o máximo que pude. Sem querer perder o bolo, mas com medo de arriscar, inventava desculpas, criava dificuldades: que a moça era grande e podia me bater; que os irmãos dela podiam me dar uns cascudos; que estava sujeito a levar uma pisa, quando chegasse em casa. Eram muitos os senões, que o mandante ia demolindo um a um: que a moça não reagiria; que, se houvesse reação, eu conseguiria escapar; que os irmãos dela não estavam por ali e que o velho Loura jamais iria saber.
- Só se for bolo de Botiqueira - disse eu, por fim, como se com aquilo jogasse a última cartada para fugir à tentadora e arriscada tarefa.
   A condição imposta, como já frisei, não passava de protelação;  a banca de Botiqueira  regurgitava de iguarias para todos os gostos. Por essa razão, a exigência de que o prêmio fosse o bolo dela só facilitava as coisas.
- Certo, bolo de Botiqueira - concordou o rapaz, enquanto ia me empurrando para dar cumprimento ao acordo.
- Só se me der logo o bolo - exigi, já com segundas intenções.
   Enquanto isso, o leilão continuava animado, algumas jóias atingindo preços elevadíssimos.
- Quanto me dão pelo capão assado? - gritava o leiloeiro, suspendendo bonita "penosa".
- "Quinhentorréis" - brada alguém do meio da multidão, para iniciar a disputa.
- Quem dá mais? Quem dá mais?
- "Destão" - grita um afobado, dobrando a oferta.
- A jóia é um capão assado, de Biluca - apregoa o gritador, tentando valorizar o produto, ao citar a hoteleira de maior fama do lugar.
   As ofertas iam aumentando, o pregoeiro teimando em não entregar a jóia, querendo mais, incentivando o lavrador a abrir as burras para os cofres de Santo Antônio, o bom casamenteiro.
- Então - dizia ele - não fizeram boas desmanchas? Não estão de bom preço a farinha e a tapioca? Quem dá mais?
   O capão assado já estava "nas alturas", valendo mais de dois mil réis. Aí, percorreu o leiloeiro os olhos pela mesa farta de ofertas e verificou que ainda restavam mais de dez assados como aquele. “É bom não abusar” - concluiu.
- Dois mil réis... e dou-lhe uma; dois mil réis... e dou-lhe duas... Quem dá mais? Quem dá mais? Ninguém? Dois mil réis... E dou-lhe três. Arrematou o velho Janjão.
Logo em seguida, suspende um bolo.
- Bolo de Botiqueira - vai apregoando.
Chovem as ofertas. Depois de tantas:
- Dou-lhe uma... destão; quem dá mais? E dou-lhe duas... destão; ninguém dá mais? E dou-lhe três. A jóia pertence a meu “padrim” Loura - anuncia Antônio Moisés, baixando a jóia. 
Enquanto o leilão corria, a juventude brejeira desfilava no pequeno adro, as moças pela direita, os rapazes no sentido inverso. Decisões eram tomadas. Pares se formavam, namoros encaminhados, conversas de pé-de-ouvido pelos cantos e desvãos ou ao longo das calçadas, um nervoso toque de mãos, um beijo medroso, um rápido abraço de alguém mais afoito.
Em torno de .................... e de mim aumentara a turma de gaiatos, todos querendo ver as bonitas pernas de ..........., a futura "piscolga".
- Só se me der logo o bolo - teimava eu, querendo bancar o sabido.
Após convencer-se o mandante de que eu só iria cumprir a tarefa depois de recebido o prêmio, foi-me dado o bolo, que foi imediatamente comido. Comido não, devorado. Pão-de-ló, de Botiqueira, gostoso. Delícia irrecusável.
- Agora vá - ordena-me o mancebo, demonstrando impaciência, uma vez que me tornara  devedor. - Vá, vá...  senão a moça vai embora.
- Só se me der outro pedaço - retruquei, tentando escapulir.
Pegam-me pelo braço, puxam-me as orelhas. E eu, teimoso:
- Só se me der outro pedaço.
Compram outro pedaço. Mas agora não mo entregam, exigem que, primeiro, cumpra a tarefa. O bolo ali, cheirando, desafiando meu apetite infantil nunca saciado de bolo. Imensa é a vontade; mais que a barriga, crescem-me os olhos. Já comera um bom pedaço. Por que não me dou por satisfeito? Vou cumprir minha parte no negócio, levando atrás de mim a turma de malandros.
O patamar agora está superlotado. Haviam chegado os retardatários. As pessoas mais idosas e algumas senhoras que rezavam dentro da igreja haviam saído para ver o leilão. Grande era o burburinho.
Ponho-me em posição estratégica. O bolo exala, o estômago quer; mais que isso: o estômago exige. Quem é a moça? Nem sei mais. Confundo-me todo. É qualquer uma.
E zás... Tarefa cumprida.
Mas o que se vê, ato contínuo? Uma senhorita no chão, toda enredada no vestido e nas muitas anáguas, como era a moda de então para fazer saia rodada. No afã de saborear a guloseima, havia derrubado minha própria irmã.
No encerramento do leilão, Batista soltou os últimos foguetes, cujo efeito provocou delírio em crianças e adultos ao explodiram no céu, numa apoteose de  chuva de lágrimas coloridas que lentamente desciam do espaço para se diluírem no éter pouco antes de alcançar o chão.
Não ganhei o segundo pedaço de bolo de Botiqueira. Nem me foi dado ver o espetáculo dos fogos de lágrimas. Tampouco comi da jóia arrematada por meu pai, que assim o fazia como exemplar castigo. Mas ganhei, como segundo prêmio, uma dúzia de bolos... de palmatória.

Obs: Esta crônica faz parte do livro DE PÉ - COXÓ, que está sendo postado em meu blog, em capítulos.



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quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Cultura & Arte - Paisagem do Interior



PAISAGEM DE INTERIOR - Jessier Quirino

Matuto no mêi da pista
menino chorando nu
rolo de fumo e beiju
colchão de palha listrado
um par de bêbo agarrado
preto véio rezador
jumento jipe e trator
lençol voando estendido
isso é cagado e cuspido
paisagem de interior.


Três moleque fedorento
morcegando um caminhão
chapéu de couro e gibão
bodega com surtimento
poeira no pé de vento
tabulêro de cocada
banguela dando risada
das prosa do cantador
buchuda sentindo dor
com o filho quase parido
isso é cagado e cuspido
paisagem de interior.


Bêbo lascando a canela
escorregando na fruta
num batente, uma matuta
areando uma panela
cachorro numa cadela
se livrando das pedrada
ciscador corda e enxada
na mão do agricultor
no jardim, um beija-flor
num pé de planta florido
isso é cagado e cuspido
paisagem de interior.


Mastruz e erva-cidreira
debaixo dum jatobá
menino querendo olhar
as calça da lavadeira
um chiado de porteira
um fole de oito baixo
pitomba boa no cacho
um canário cantador
caminhão de eleitor
com os voto tudo vendido
isso é cagado e cuspido
paisagem de interior.


Um motorista cangueiro
um jipe chêi de batata
um balai de alpercata
porca gorda no chiqueiro
um camelô trambiqueiro
avelós e lagartixa
bode véio de barbicha
bisaco de caçador
um vaqueiro aboiador
bodegueiro adormecido
isso é cagado e cuspido
paisagem de interior.


Meninas na cirandinha
um pula corda e um toca
varredeira na fofoca
uma saca de farinha
cacarejo de galinha
novena no mês de maio
vira-lata e papagaio
carroça de amolador
fachada de toda cor
um bruguelim desnutrido
isso é cagado e cuspido
paisagem de interior.


Uma jumenta viçando
jumento correndo atrás
um candeeiro de gás
véi na cadeira bufando
radio de pilha tocando
um choriço, um manguzá
um galho de trapiá
carregado de fulô
fogareiro abanador
um matador destemido
isso é cagado e cuspido
paisagem de interior.


Um soldador de panela
debaixo da gameleira
sovaqueira, balinheira
uma maleta amarela
rapariga na janela
casa de taipa e latada
nuvilha dando mijada
na calçada do doutor
toalha no aquarador
um terreiro bem varrido
isso é cagado e cuspido
paisagem de interior.


Um forró de pé de serra
fogueira milho e balão
um tum-tum-tum de pilão
um cabritinho que berra
uma manteiga da terra
zoada no mêi da feira
facada na gafieira
matuto respeitador
padre, prefeito e doutor
os home mais entendido
isso é cagado e cuspido
paisagem de interior.



Jessier Quirino

MINI-CURRÍCULO
Arquiteto por profissão, poeta por vocação, matuto por convicção. Apareceu na folhinha no ano de 1954 na cidade de Campina Grande, Paraíba e é filho adotivo de Itabaiana também na Paraíba, onde reside desde 1983.
Filho de Antonio Quirino de Melo e Maria Pompéia de Araújo Melo e irmão mais novo de Lamarck Quirino, Leonam Quirino, Quirinus Quirino e irmão mais velho Vitória Regina Quirino.
Estudou em Campina Grande até o ginásio no Instituto Domingos Sávio e Colégio Pio XI. Fez o curso científico em Recife no Esuda e fez faculdade de Arquitetura na UFPB -- João Pessoa, concluindo curso em 1982. Apesar da agenda artística literária sempre requisitada, ainda atua na arquitetura, tendo obras espalhadas por todo o Nordeste, principalmente na área de concessionárias de automóveis.
Na área artística, é autodidata como instrumentista (violão) e fez cursos de desenho artístico e desenho arquitetônico. Na área de literatura, não fez nenhum curso e trabalha a prosa, a métrica e a rima como um mero domador de palavras.
Interessado na causa poética nordestina persegue fatos e histórias sertanejas com olhos e faro de rastejador. Autor dos livros: "Paisagem de Interior" (poesia), "Agruras da Lata D`água" (poesia), "O Chapéu Mau e o Lobinho Vermelho" (infantil), "Prosa Morena" ( poesia e acompanha um pires de CD ), "Política de Pé de Muro - O Comitê do Povão" ( legendas e imagens gargalhativas sobre folclore político popular ), CDs: "Paisagem de Interior 1 e Paisagem de Interior 2", o livro: "Bandeira Nordestina" (poesia e acompanha um pires de CD), A Folha de Boldo Notícias de Cachaceiros - em parceria com Joselito Nunes -- todos editados pelas Edições Bagaço do Recife - além de causos, músicas, cordéis e outros escritos.


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domingo, 4 de dezembro de 2011

Sócrates Brasileiro - 1954-2011


Em homenagem a um dos mais talentosos jogadores do futebol brasileiro, que faleceu hoje. Reproduzimos uma reportagem do G1.com

 

Ex-jogador Sócrates morre em SP

Ele estava internado no Hospital Albert Einstein.
Segundo hospital, ele teve choque séptico de origem intestinal.


O ex-jogador Sócrates, de 57 anos, morreu na madrugada deste domingo (4) no Hospital Albert Einstein, na Zona Sul de São Paulo. Segundo o hospital, Sócrates morreu em decorrência de um choque séptico às 4h30. Ele estava internado no hospital desde quinta-feira (1º) na Unidade de Terapia Intensiva (UTI).
O ex-jogador estava em coma induzido e respirava com a ajuda de aparelhos. Segundo boletim médico divulgado neste sábado (3), o quadro dele já era grave. Esta foi a terceira vez este ano que o ex-atleta e ídolo do Corinthians foi internado. Nas duas ocasiões anteriores, ele passou por tratamento para conter uma hemorragia digestiva, causada pelo consumo prolongado de álcool.
Em sua última internação no mesmo hospital, dia 5 de setembro, Sócrates ficou na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) e precisou da ajuda de aparelhos para respirar. Recuperado, recebeu alta médica dia 22. Anteriormente, ele havia ficado nove dias internado, e saiu no dia 27 de agosto. Segundo a mulher de Sócrates, o ex-jogador teve uma infecção no intestino causada por uma bactéria.
De acordo com a família do jogador, o corpo dele será levado para Ribeirão Preto. A previsão de chegada é às 13h. Depois, será realizado o velório, e o enterro está marcado para as 17h deste domingo.
Bebida
Em entrevista ao Fantástico gravada após ter alta, Sócrates contou como a bebida quase o levou à morte. Ele reconheceu que era dependente de álcool. “É nessas horas que a gente cresce. Saio muito mais forte, muito maior e com muito mais compromissos e responsabilidades que eu tinha antes”, resumiu.
O ídolo corintiano, do calcanhar inconfundível e formado em medicina, falou abertamente sobre a doença que quase o levou à morte e os problemas com bebida alcoólica. “Eu tenho um ponto cirrótico. É uma lesão que não é tão grave, mas ela está localizada em área hipersensível do fígado. Essa lesão é causada, fundamentalmente, por álcool”, disse Sócrates.
Perfil
Sócrates era o mais velho de seis irmãos – o ex-jogador Raí é um deles -, e teve seis filhos. Ele começou sua carreira em Ribeirão Preto, no interior de São Paulo. Por causa da faculdade de medicina, que cursava na Universidade de São Paulo (USP), ele quase não treinava. Em 1978 ele foi para o Corinthians, onde se consagrou como ídolo. Já era médico formado e ganhou da torcida o apelido de Doutor. Com o time, foi bicampeão paulista em 1982 e 1983.
O jogador participou de duas Copas do Mundo pela Seleção Brasileira. Em 1982, foi capitão. Depois de uma breve passagem pelo Fiorentina, da Itália, atuou ainda no Flamengo e no Santos.
Sócrates também era politizado. Ele participou da campanha pelas Diretas Já, e em 1984 foi um dos principais idealizadores da Democracia Corintiana, que reivindicava para os jogadores mais liberdade e mais influência nas decisões administrativas do clube.


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sábado, 3 de dezembro de 2011

Tres Meses


          Bom dia, pessoal.
          Quero dizer da minha grande satisfação em poder dar continuidade ao nosso blog. Sem o apoio de vocês nada disso teria sido possível, pois ao iniciarmos esta empreitada não tínhamos muitas ideias de como funcionava um blog, mas com o incentivo de voces pudemos desenvolvê-lo de forma satisfatória.
          Minha sincera gratidão a todos que nos apoiaram, seja seguindo o blog, comentando ou simplesmente acessando. Pois são ações que constroem este espaço: Acessar, comentar, divulgar, seguir e publicar.
Mas uma coisa que me impressiona e traduz o sucesso do blog, são os números:
São 7.500 page views, 55 postagens, 185 comentários e 10 seguidores. Nesta última semana batemos recordes de acessos um dia após o outro. Só para voces terem uma idéia o nosso ultimo post(O Poder em Jogo) teve 72 comentarios e 464 acessos em uma semana.  


          Portanto meus amigos, são três meses e pretendemos comemorar outras datas, para tanto é preciso que continuem a prestigiar o nosso blog para que possamos comemorar números cada vez melhores e que essa interação contribua para uma aproximação cada vez maior entre o povo da terrinha.


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